sábado, janeiro 31, 2004

Um murmúrio

R. despedaçada entre excessos de silêncios
dele dela
dela para com ela
sussurra-me
tenho saudades de mim.

quinta-feira, janeiro 29, 2004

Noc Noc
Entra, que os meus braços não param de crescer.
como fios eléctricos, estão cruzados, emaranhados.
descarnados não, ainda sonham ouvir Noc Noc.

As flores do mal

A alma tomada por tolices e erros, nãos
e pecados, que nos moldam os corpos,
alimentamos nossos queridos remorsos
como sem abrigos que estimam sua sujidão

temos pecados teimosos e emendas balofas;
a verdade, se a dizemos, custa uma fortuna
que, ufanos, desbaratamos até à impecúnia
crendo com vis lágrimas apagar falhas de gosto.

(...)

Mas no infame zoo de nossos vícios, entre
os muitos linces chacais e panteras
macacos serpentes abutres e quimeras
além de monstros que silvam entre dentes

Um há, de todos o mais feio maléfico e imundo;
é verdade que não berra nem tem pruridos
mas faria da terra um monte de ruídos,
se pudesse, e num bocejo tragaria o mundo;

É o Tédio! Sente-se-lhe nos olhos um senão,
sonha com torturas enquanto chupa rebuçados.
Tu que me lês já conheces esse monstro delicado,
meu impostor nato, minha cópia e meu irmão!

Charles Baudelaire

quarta-feira, janeiro 28, 2004

R.
R. quando casou fez um contrato pré-nupcial.
Não queria ser Pai.
Ela a aristocrata falida (como ele a chama) anuiu.

Numa fuga de corpo e alma com uma inglesa jovial ,
um pequeno R. ganhou forma.

Quando soube por telefone, R., angustiado,
combinou um cinema, um café com a sua mulher.
“ Pensei que me iria contar algo muito pior”
R. sentiu a pele nos pulsos a abrir lentamente

Semana seguinte é a mulher que convida R
um cinema, um café.
“ Meu querido, compreendo que não foi uma opção,
mas perante este novo facto penso que o contrato pré-nupcial deixou de fazer sentido.”

Uma pequena R. ganhou forma.

R. contou-me esta estória numa viagem de comboio Porto Lisboa.
Numa carruagem cheia de ouvidos
Como sentisse as contracções e tivesse que parir ali e já.
Semanas depois ainda O recordo com um sorriso.

terça-feira, janeiro 27, 2004

..........

A mulher na rua
Com o seu colar
a saltar na poças da chuva
de encontro ao quotidiano
húmida da chuva.

A mulher em casa
a guardar os movimentos bruscos
aguarda o desapertar do colar
a tua mão no pescoço e no peito.
húmida de ti.

Quotidiano
Decisões.
Todos os dias.
Umas não damos por elas
outras contorcem-se dentro de nós.
a dádiva e a punição da adrenalina
pólos positivos a transformarem-se em negativos
varia com o limite de cada um
com o momento
com o estado geral
os olhos não param
o coração anda acelerado.
As mãos ainda não tremem.

Os dias coitados, continuam a arder
na tentativa do encontro de um canto
onde espírito possa repousar.

E se um canto encontrar e o repouso ganhar,
quando eu desligar,
que exista magia
e tu me consigas consertar___________________________________